quinta-feira, 16 de setembro de 2010

"As Troianas - Vozes da Guerra" - Direção: Zé Henrique de Paula


 Foto: Lenise Pinheiro

"As Troianas - Vozes da Guerra" (São Paulo)/ Teatro de Câmara Túlio Piva - "Baseado em Eurípedes, com direção de Zé Henrique de Paula, o espetáculo suprime a fala dos personagens e faz paralelo entre a Guerra de Troia e a Segunda Guerra Mundial. As sobreviventes troianas simbolizam as judias arrasadas pelo horror do holocausto, levantando questionamentos sobre privação de direitos, medo, dor e esperança. O texto é transmitido por ações e pela trilha sonora, composta por músicas folclóricas iídiche e gregas, entre outras". 
Contrariando o boca a boca porto-alegrense lá fui, ontem, assistir a essa montagem paulista, falada em alemão. Posso dizer uma coisa: ainda bem que segui a minha intuição. O espetáculo é belíssimo no sentido plástico, estético e teatral. O parelelo criado entre a Guerra de Tróia e o Holocausto é genial. Com uma iluminação, ambientação sonora, figurinos, cenário e elenco afinadíssimos, esse espetáculo teria de tudo para ser uma grata surpresa no Poa Em Cena, mas não o foi. Eu não entendo uma linha sequer em alemão, mas como conheço e estudei o mito trágico e o Holocausto, a barreira da língua não me incomodou, até porque há várias níveis de entendimento e me enquadrei num deles, o da emoção. Mas confesso que para as pessoas que não têm conhecimento sobre tragédia nem entendem alemão, deve ter sido meio difícil acompanhar a história. Há uma cena inesquecível, para mim, nessa montagem: Astianax se despedindo da mãe, Andrômaca, sabendo que vai para a morte, cantando uma linda canção em ídiche. O herói. Emocionante, intenso, trágico.
Quero destacar aqui algumas atuações: da atriz que faz Andrômaca, verdadeira, intensa, trágica desde o primeiro segundo; da atriz que faz Helena, tão intensa e desafiadora como a belíssima traidora; do ator que faz o sub-comandante alemão, num trabalho excepcional na linha tênue entre o dever e a culpa e a do ator que faz o comandante alemão/Menelau, tão desprezível em todos os sentidos que a palavra possa oferecer. Destaco também a interpretação de todos nas canções, vozes afinadas que nos preenchem de sensações. Vocês devem estar pensando: E Hécuba? Bem, a meu ver, a atriz que faz Hécuba não tem o "peso" necessário, a tragicidade que a personagem exige ... ela fica o tempo todo demonstrando o que vai fazer - como se fosse montar uma coreografia de ballet contemporâneo - e não vive, não emociona. E Hécuba é uma personagem divina, é a Rainha de Tróia que perde todos e tudo, mas não se deixa abater: vai de cabeça erguida rumo à morte anunciada. 

"Ir embora com a visão dessas chamas queimando dentro dos meus olhos! Preciso me levantar. Preciso olhar para minha cidade e lhe dizer adeus. Em todo o mundo nunca houve outra igual a ti! Ah, esplêndida morada! Terra bendita até a pouco tão próspera! Ah, terra que deu a luz aos meus filhos! (Ajoelha e bate na terra com as mãos) Filhos, respondam! (Silêncio) Senhor do tempo, Zeus, nosso pai, filho de Crônos! Vê como sofrem esses teus filhos. (Longo silêncio) Vamos, pernas! Me ensinem a andar como uma escrava."
(Hécuba em "Tróia")

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